19 maio, 2015

À força do cassetete

Com a devida vénia



No dia de ontem fomos brindados com imagens de brutalidade assustadora decorrente da actuação das forças policiais, mormente as imagens de Guimarães, no rescaldo do jogo do Benfica contra o Vitória local.

Não se percebe qual a perigosidade de uma família, pais, avós e crianças incluídas. Aquilo a que se assistiu é violência pura e gratuita que pretende punir cidadãos indefesos e não assegurar a manutenção da ordem pública. Provavelmente um descarregar da raiva e das frustrações dos próprios polícias, enquanto cidadãos, resultado das humilhações e vilanias que também lhes tem sido infligidas por este Governo, enquanto funcionários públicos que também são.

Nos incidentes de Lisboa, o cenário terá sido diferente, já que ocorreram desacatos, supostamente entre facções de adeptos, que alastraram posteriormente, originando agressões às próprias forças policiais. Contudo, também neste caso, a actuação das polícias extravasou o ataque aos arruaceiros tendo distribuído também “pau e varapau” a esmo e sem critério a cidadãos incautos e pacíficos que nada tinham a ver com os distúrbios, punidos apenas por estarem no “local errado, à hora errada”.

Estes incidentes merecem-nos algumas reflexões.

As forças policiais são fundamentais para a manutenção da ordem pública, são pedra angular do próprio Estado de Direito, mas a sua actuação deve conformar-se com as próprias regras que sustentam e dão corpo ao mesmo Estado de Direito. Quando tal não sucede é o próprio Estado de Direito que é atacado e posto em causa por quem tem o dever funcional de o defender.

As forças policiais são corpos estruturados e hierarquizados que podem, e devem quando tal se revelar necessário, usar com legitimidade a violência. E essa legitimidade deriva de um mandato cidadão que o contrato social, carta fundadora do Estado, lhes confere. Quando exorbitam na sua actuação não devemos questionar tão-somente o agente prevaricador mas toda a cadeia de comando que o antecede e lhe confere meios de operacionalidade.

As cenas do dia de ontem levam-nos a questionar os acontecimentos que vimos enquanto sintoma de disfunções sociais mais fundas.

É o desespero dos cidadãos que vem ao de cima e que extravasa, seja em alegria, seja em frustração, compensação para um presente sem esperança e sem futuro. É o excesso das forças policiais, sem comando, sem controlo, sem respeito pelos cidadãos, fazendo-os pagar pelo desrespeito com que têm sido mimoseados pelos defensores do miserabilismo que nos governa.

Se o País está sem norte e sem rumo, sem futuro e sem esperança.

Se Passos não governa porque não tem tempo, já que passa os dias em campanha a inaugurar queijarias e a estudar sondagens.

Se o Presidente da República, nada vê, nada sabe, nada diz, e a tudo assiste refastelado no seu cadeirão em Belém, demitindo-se da sua obrigação de zelar pelo bom funcionamento das instituições democráticas, não nos devemos surpreender pela ocorrência destes incidentes.

Quando os comandantes do País ligaram o piloto automático, como podemos exigir aos comandos das forças policiais que saibam exactamente como fazer cumprir, sem excessos, o seu papel de defesa do Povo e do Estado de Direito?

O exemplo vem sempre de cima. Se temos um Governo cuja acção, durante quatro anos, se pautou por ataques sistemáticos e reiterados à Constituição da República, com a bênção e assinatura do Presidente da República, como podemos estranhar que as chefias policiais não consigam fazer os seus subordinados acatar os regulamentos e as normas democráticas de actuação, que juraram cumprir e respeitar?

Quando o timoneiro falha, o barco adorna. E se o barco for o País, é o País que fica à deriva.

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