O homem que já afirmou que "pior do que não ter um Orçamento do Estado é ter um mau Orçamento do Estado" é o mesmo que admitiu que "a realidade que se nos oferece" é que depende do PSD "a salvação do país". Ah, e também que Portugal está na iminência de, "se o PSD não viabilizar este Orçamento, não ter crédito externo e de não ter financiamento para o país", coisa pouca, evidentemente. Isto foi na segunda-feira à noite. Na terça-feira, o líder do principal partido da oposição mudou outra vez de ideias. Invocando Sá Carneiro, a alma mater social--democrata para a mitologia das rupturas, voltou a acenar com o chumbo, uma vez "que um partido com a história do PSD não pode ceder" a "chantagens" e não quer "contribuir para mais desemprego em Portugal, para mais falências em Portugal, para mais recessão em Portugal, sabendo que isso não valerá de nada".
Alguém se entende? Alguém percebe este discurso? Se o líder diz que "o PSD não pode deixar de ajudar a melhorar a situação do país, mas deixar passar o Orçamento como aquele que o governo manifestou intenção de apresentar não é melhorar a situação", podemos deduzir que chumba. Se nos reportarmos ao discurso da véspera, em que Pedro Passos Coelho afirmou que o seu único critério é que "como poderá ajudar o país a passar este momento difícil", podemos deduzir que se abstém.
A conclusão terrível de que o que Pedro Passos Coelho diz não se escreve e de que haverá sempre a hipótese de mudar de opinião no momento seguinte não é entusiasmante para quem gosta de oposições fortes e alternativas de governo. Sim, o que Sócrates diz também não se escreve - e desde que chegou ao governo reescreveu várias vezes a história. Mas de Passos Coelho, novíssimo na liderança, até alguns cépticos se tornaram crentes numa possível alternância.
Se a total indecisão de Passos Coelho face ao Orçamento é sincera, o cenário é assustador. Se se trata de manipulação com o objectivo de aparecer como o "salvador da pátria", é de uma ingenuidade incrível. Depois de ter conseguido que o PS passasse o Verão a atirar-lhe à cara a revisão constitucional e o Estado social, Passos Coelho conseguiu agora tornar-se no centro das atenções - quando o que devia estar no centro das atenções era mesmo o tal mau Orçamento, já suficientemente conhecido e relativamente ao qual o PSD não apresentou nenhuma alternativa. Agora pede ao governo para ouvir as suas propostas, mas a verdade é que, nesta altura do campeonato que já vai longo ainda não apareceu nenhuma.
Passos Coelho afirmou esperar que o partido se reveja na opção que vier a tomar e está aborrecidíssimo com a pancada que tem levado, mesmo dentro do próprio PSD: queixa-se de que "muitas pessoas hoje - algumas até dentro do PSD - acham preferível obrigar o PSD a mudar de posição do que sugerir ao PS que tenha juízo, que ouça o país e que faça o que é preciso". Deixou um desabafo-lamento: a "verdade é que nenhum dos que fazem o apelo" tem de decidir e que "teria preferido ser presidente do PSD num tempo em que este problema não se colocasse". Ora, um presidente do PSD tem de lidar com todos estes problemas e se for eleito primeiro-ministro com outros piores. Como Passos Coelho conseguiu em seis meses deitar ao lixo um gigantesco capital político com a delicadeza do elefante na loja de porcelanas é um mistério. Para quem gosta da existência de alternativas de governo, sejam de esquerda ou de direita, tudo isto é um aborrecimento
15 outubro, 2010
Passos Coelho, assim mesmo
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário