26 março, 2011

NUN – Nova União Nacional

«José Sócrates imaginou que se podia fazer política em Portugal com um mínimo de decência e sentido da responsabilidade. Foi um erro. Não pode. E não pode porque a classe política se degradou nestes últimos anos muito mais do que a situação económica do país. A bancarrota da política partidária teve lugar há muito. E nenhum FMI lhe pode valer.

O extremismo é hoje prevalecente. À esquerda, Partido Comunista e Bloco, dois eunucos que não param de discutir o Kamasutra, não têm qualquer projeto de sociedade viável e assim confinam-se a uma resistência agressiva e sectária contra tudo e qualquer coisa. Em consequência e como ficou cristalinamente demonstrado servem sobretudo de trampolim para a direita. O CDS, esse, tornou-se num partido unipessoal e tem como singular e único objetivo arranjar um ministério qualquer para Paulo Portas. Já o PSD quer mesmo ir ao pote, e para esse declarado propósito vale tudo. O extremismo das respetivas posições não é portanto, em nenhum dos casos, sequer ideológico. É simplesmente o sintoma de uma decadência brutal da política partidária. Não são os jovens, mas a política portuguesa que se tornou mesmo muito rasca.

Acresce que temos um Presidente da República que no momento mais crítico da vida nacional decidiu ficar a tratar dos cortinados do Palácio de Belém.

Acontece contudo que o mundo é mais complexo do que parece. Os cálculos lineares da Nova União Nacional (NUN), essa amálgama que junta esquerdistas, direitistas, comentadores e muitos ingénuos, podem sair furados. Desde logo porque, servindo para destruir, o NUN não serve para construir nada. O NUN, como a sigla indica, é uma coligação negativa, uma espécie de mula que não consegue procriar. Depois porque a partir desta semana toda a desgraça que se abater sobre Portugal tem responsáveis bem conhecidos. Quando os funcionários públicos deixarem de receber salários bem podem ir pedir contas a Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã; quando as empresas começarem a falir, às catadupas, os empresários terão de exigir satisfações a Passos Coelho e Paulo Portas. Quando a miséria e a violência associada aumentar os portugueses sabem perfeitamente quem foram os instigadores. E, bem vistas as coisas, a realidade dos "especialistas" que todos os dias brilham nos telejornais, tanta vez em regime de omnipresença, não é a realidade do país. As eleições não estão ganhas à partida para ninguém. É aliás muito improvável que delas possa emergir uma solução maioritária e estável.

Mas de tudo isto que é evidente duas outras coisas merecem reflexão. O debate no parlamento mostrou o quanto as oposições estão dissociadas da realidade europeia. A maioria dos discursos retomou a malfadada lógica do orgulhosamente sós, como se o país estivesse isolado e não integrado no espaço europeu, com tudo o que isso implica de responsabilidade alargada e cooperativa. Que isso suceda com os que odeiam a Europa, PC, Bloco e CDS, não espanta ninguém. Mas que afete igualmente o PSD, que em tempos foi um dos pilares da nossa adesão à comunidade europeia, isso sim é de facto extraordinário. Passos Coelho, para além de um texto para inglês ver, tem iludido sistematicamente a questão central da atividade política/partidária no contexto em que nos encontramos. Ou seja, a política já não é meramente nacional mas, em toda sua extensão e consequência, uma política na Europa e para a Europa. O ato deplorável a que assistimos nestes últimos dias não se reflete só na vida dos portugueses, mas afeta toda a Europa como projeto político avançado num mundo globalizado. E, desde logo, representa mais uma machadada no Euro, moeda fundamental para uma coesão europeia e para a criação de uma verdadeira cidadania europeia.

Um segundo aspeto não pode também ser descurado. O dos governos minoritários. Não é aceitável que em Portugal os partidos se recusem a desenvolver entendimentos que permitam gerar alguma estabilidade governativa. Por toda a Europa os países têm governos de coligação, com dois, três e, por vezes, mais partidos. Por cá isso é de momento uma impossibilidade prática. E agora, depois do golpe do NUN, infelizmente ainda o é mais. Com esta gente e com estes políticos, o Tsunami social está pois a aproximar-se cada vez mais e com força redobrada da nossa costa. Aguentem-se. » [Jornal de Negócios]

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