19 fevereiro, 2015
Correio da Manhã ataca ao ser atacado
Maria José Morgado
Longe vai o tempo em que esta senhora merecia muito da nossa consideração. Hoje merece pouca ou nenhuma.
Faal, fala... sempre muito, mas... há sempre falta de meios. Se os não tem para produzir o trabalho com a eficácia que entende, só tem uma solução – pedir a de4missão do cargo que ocupa.
Algumas das sua respostas são curiosas.
“Na semana em que o pacote de leis anti-corrupção deu entrada na Assembleia da República e aguarda discussão, e a duas semanas da discussão da lei do enriquecimento ilícito, Maria José Morgado admite que as leis dão jeito, mas do que os magistrados precisam é de ferramentas de trabalho que facilitem detetar a criminalidade económica e financeira, segui-la e confiscar os lucros ilícitos. Na entrevista que deu à RTP Informação, esta quarta-feira à noite, a diretora do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) recusou sempre comentar casos concretos. Mas, questionada sobre a decisão de prender o ex-primeiro-ministro José Sócrates, comentou que “as pessoas não estão loucas”.
“Ninguém me perdoaria se eu tomasse uma posição num caso concreto. Mas sou solidária com os meus colegas”, disse, sobre o caso José Sócrates. A decisão do juiz Carlos Alexandre de prender o ex-primeiro-ministro mereceu um único comentário: “as pessoas não são loucas“.
Sobre as fugas de informação, Maria José Morgado disse que “a fuga de informação, por parte da defesa, é frequente em casos de grande corrupção”, ou seja, quando estão em causa pessoas com muito poder. E defendeu que o Ministério Público deveria dar mais informações oficiais sobre os casos, sempre que isso não prejudique os processos.
Sem nunca comentar diretamente o caso Sócrates, a magistrada explicou que “em circunstâncias completamente anormais de compensações avultadas em circunstâncias inexplicáveis, não há nenhuma impossibilidade em termos de previsão penal de imputação de um crime”. Nem mesmo se não for possível provar concretamente uma troca direta de dinheiro por ações.
“A corrupção não tem de estar associada de forma causalista, ‘dou-te isto em troca de um ato concreto’, é algo de mais complexo que pode envolver uma série de comportamentos e decisões. Por exemplo o pagamento de rendas ilícitas a alguém. E essa autoridade, que entra num clima de permeabilidade, já sabe que quando tiver de tomar decisões desfavoráveis em relação a essa pessoa, terá de transformar a decisão desfavorável em favorável ou fechar os olhos. Isto não é corrupção? É corrupção”, disse Maria José Morgado.
A diretora do DIAP atribuiu a existência de mais casos mediáticos nos últimos tempos à maior experiência e coragem dos magistrados, mas também aos efeitos da crise financeira que se vive em Portugal. “A crise económica é como quando o mar baixa, aparece o lodo. Então houve muito lodo que ficou à vista e que possibilitou o avanço da tutela“, disse, acrescentando que a chegada da crise ajudou a explicar “como é que o dinheiro dos nossos impostos era esbanjado e como o orçamento de Estado era uma manjedoura para muita gente”. A própria dureza da crise “permite o partir do vidro e perceber o que está para além de uma paisagem aparentemente harmoniosa”.
Morgado considerou ainda que “há uma grande vulnerabilidade ao nível do Estado central, nos negócios do Estado central, na contratação pública” e deu como exemplo as fraudes na saúde, nomeadamente, na aquisição de equipamentos hospitalares. “A saúde é uma área vulnerável à fraude e corrupção”, onde “há muito dinheiro e recursos muito elevados e que podem comprar decisores, sejam políticos ou públicos”, disse.
Legislação nós temos muita
A serem aprovados, o novo pacote de leis anti-corrupção e o enriquecimento ilícito serão “bem-vindos”, mas a magistrada lembrou que “de dois em dois anos há um pacote anti-corrupção”. E que a lei portuguesa já prevê a inversão do ónus da prova – pedida na lei do enriquecimento ilícito – no artigo 7 da Lei 5/2001, “em que se prevê que um arguido que seja condenado por crimes cujo património seja incongruente com aquilo que é conhecido, presume-se que esse património é de origem criminosa. E o Ministério Público na acusação faz a liquidação desse património e promove ao tribunal a declaração de perda desse património por presunção de proveniência ilícita”, lembrou, dizendo que esse artigo “não tem sido tão utilizado quanto isso”.
O défice na justiça, explicou, é ao nível das ferramentas informáticas, da intelligence e do cruzamento de dados, dificultado pela lei de proteção de dados. “A lei de proteção de dados proíbe o cruzamento dos nossos próprios dados, o que é um absurdo“, disse. À falta destas ferramentas, o pacote de leis anti-corrupção “pode ser vantajoso”, nomeadamente “no controlo de património de cargos públicos e políticos.
Na questão da criminalidade económico-financeira estava a faltar, de acordo com a diretora do DIAP, um risco real para os infratores, de perderem os bens da atividade criminosa e de serem condenados. “Se compararmos com um traficante de droga, ele sabe que se for encontrado com uma certa quantidade de heroína ou cocaína, que é seguramente condenado a pena severa de prisão. Há um risco assegurado a essa atividade. A questão é que na criminalidade económico-financeira, o nosso sistema penal nos últimos 20 anos mostrava dificuldade em criar um risco para atividades como contrabando qualificado, crimes financeiros e tráfico de influências. As condenações eram praticamente inexistentes”. Algo que tem vindo a melhorar. “A justiça tem ganho capacidade, nomeadamente no combate à criminalidade”, disse, acrescentando que “a partir do momento em que há casos mediáticos, isso transmite uma mensagem para os criminosos“. Mas ainda há muito trabalho a fazer porque “ainda temos uma situação de crime económico-financeiro metastizado”, disse.
“Nesta área temos um inimigo sem rosto porque estamos no domínio do crime sem vitima, porque a vítima somos todos nós e não nos podemos queixar coletivamente. Estes são os custos intangíveis da corrupção: são mais défice público, mais despesa pública, serviços públicos mais caros, injustiça fiscal, etc.”.
Operação Marquês!!
Em entrevista ao DN, o presidente da distrital da Ordem dos Advogados, António Jaime Martins, defende que as regras processuais são para cumprir "por todos".
Como dirigente da Ordem já recebeu algumas queixas de detenções ou buscas feitas sem os requisitos processuais exigidos por lei?
A detenção de pessoas e a realização buscas domiciliárias, porquanto atingem a esfera de liberdade individual de qualquer cidadão que delas possa ser objeto, sem que exista culpa formada, mas apenas meros indícios da prática de um ilícito, o qual na opinião dos investigadores pode justificar as referidas medidas, obedece a um conjunto de regras estabelecidas na nossa Constituição e no Código de Processo Penal.
Compete aos Advogados no exercício do direito de defesa dos seus constituintes invocarem nos respetivos processos judiciais as nulidades e as irregularidades em que entendam que se consubstanciam as violações de normas processuais penais que balizam a execução das referidas medidas.
Quando a violação das regras se afigura aos Advogados como grosseira e ofensiva das normais regras de funcionamento de um Estado de Direito, é natural e expectável que se queixem à sua Ordem.
Podem as detenções e buscas ser realizadas sem a entrega de mandados de detenção e a constituição dos visados como arguidos?
A resposta é obviamente que negativa. A falta de constituição de um cidadão que vai ser detido ou buscado no seu domicílio como arguido, sendo o mesmo para a investigação suspeito da prática de um ou mais crimes, só pode ter como explicação uma grande distração de quem realiza a diligência ou o propósito de coartar o direito de defesa do visado.
Aliás, a constituição do cidadão nestas circunstâncias como arguido, visa precisamente conferir-lhe um conjunto de prerrogativas com vista a assegurar-lhe um direito de defesa efetivo, designadamente, a possibilidade de não prestar quaisquer declarações sobre o processo sem que o silêncio o possa prejudicar e, muito em especial, a possibilidade de ser assistido por Advogado que o acompanhará na sua defesa.
Também a realização de buscas domiciliárias sem mandado é ilegal. Mesmo nas situações em que não existe mandado, a autorização dos visados deve ser informada e esclarecida, não podendo resultar da surpresa ou da intimidação natural que uma operação deste género habitualmente motiva, pois, os visados, desacompanhados do seu Advogado não conseguem exercer os seus direitos de defesa, quer por não saberem, quer até por recearem, ainda que injustificadamente, um maior vigor na iniciativa de quem as realiza.
As regras processuais penais existem, estão em vigor e são para cumprir. Por todos. Em especial, por aqueles a quem compete dirigir a investigação e pelo Juiz de instrução que é o Juiz garante dos direitos, liberdades e garantias de todos os sujeitos processuais, sejam arguidos, assistentes ou ofendidos.
Admitir que outros procedimentos distintos possam ser empregues, seria admitir por em causa não só os processos em que tais procedimentos são adotados, como toda a estrutura acusatória em que assenta o sistema judicial penal e a confiança que o cidadão e a sociedade em geral deve ter na Justiça.
O segredo de justiça não está salvaguardadoo em Portugal?
Creio que a pergunta é retórica. Está por demais à vista de todos que é sistematicamente posto em causa. E, não obstante a sistemática violação de segredo de justiça em inúmeros processos discutidos na comunicação social, a culpa morre quase sempre solteira e quando encontra um culpado é o jornalista que protegeu a fonte.
Aliás, atualmente, a regra é como se sabe a publicidade do inquérito, a qual só pode ser afastada pelo Juiz de instrução, a requerimento do arguido, do assistente ou do ofendido, que determinará a sujeição a segredo do processo quando entenda que a publicidade prejudica os direitos daqueles sujeitos processuais, ou, por iniciativa do Ministério Público, quando os interesses da investigação o justificam, caso em que a decisão do Ministério Público carece de validação pelo Juiz de instrução.
De uma coisa tenho a certeza, a existência de segredo num processo não se justifica sem um interesse processual sério na sua manutenção, seja do arguido, do assistente ou da investigação. E o segredo muito menos se justifica quando, sem que haja qualquer interesse sério, a sua manutenção prejudique o arguido como acontece bastas vezes em processos mediatizados.
Com efeito, o que se verifica algumas vezes na prática é que a manutenção do segredo associado à incapacidade de evitar as fugas de informação sobre elementos do processo, provocam na opinião pública a formação de juízos e convicções sobre a culpa dos visados sem que exista culpa formada transitada em julgado, criando uma pressão perfeitamente dispensável sobre os Magistrados que acusam e julgam e sobre os arguidos. Estes julgamentos à pressa feitos na praça pública são bastante perniciosos para o sistema judicial, pois, ao criarem uma expectativa nos cidadãos relativamente a um determinado desfecho num processo, se o mesmo não se verificar, resultará fortemente abalada a confiança dos cidadãos no sistema. Aliás, tais expectativas, verdadeiramente, não podem ser criadas nem devem existir, pois o processo só termina com o transito em julgado duma sentença.
Nos casos mediatizados, mesmo quando a condenação acontece, a dúvida fica muitas das vezes se a condenação existiu porque é justa ou se existiu para satisfazer a opinião pública. Antecipar o resultado da justiça na praça pública em momento algum deu bom resultado.
Quem acha que são os principais responsáveis pelas fugas de informação?
As fugas de informação dos processos podem e devem ser investigadas. Muitas das vezes, não é difícil perceber quem são os responsáveis. Basta discernir quem são os intervenientes processuais que têm acesso à informação divulgada. Se todos, se apenas alguns. Se forem os investigadores apenas, terão que ser estes os responsáveis, mais não seja pela incapacidade de impedirem a fuga de informação quando o processo está à sua guarda. Se todos os intervenientes têm acesso a todos os elementos do processo, então, há que discernir a quem serviu a divulgação.
Qual a sua posição face ao artigo publicado pela sua colega Paula Lourenço no último número da Revista da Ordem dos Advogados?
Acompanho a Colega quando afirma que suposições dos processos não devem se discutidas na praça pública. Creio que compete a todos os intervenientes do judiciário em qualquer processo judicial e até às respetivas estruturas representativas, sejam os Conselhos Superiores, seja a Ordem dos Advogados, zelarem de forma intransigente, a todo o momento, pelo cumprimento das regras do jogo.
18 fevereiro, 2015
Paula Lourenço - opina na revista da Ordem dos Advogados
Um episódio de terror da série “operação Marquês”
Publicado em Fevereiro 14, 2015 por estrelaserrano@gmail.com
“Movidos pelo poder desmesurado e adrenalina circundante (eram mais de 30) na presença do juiz de instrução e de um alto Procurador da República, “agarram o advogado e levam-no para a sua própria casa e aí fazem busca não autorizada, apreendem documentação vária na presença da mulher, filho de 5 anos e bébé de dois meses que assistem horrorizados à violência com que se despejam gavetas e lhes circulam em passo militar pela casa (…)” (Paula Lourenço, in Boletim da Ordem dos Advogados)
Suponhamos que isto não é verdade e que a autora deste texto, advogada de Carlos Santos Silva e do advogado Gonçalo Trindade, ambos detidos preventivamente, está a delirar. Temos então de perguntar porque é que isto não é imediatamente desmentido pelas instituições intervenientes.
Mas suponhamos que é verdade. Estaremos nesse caso entregues a uma justiça com muita adrenalina mas muito pouco respeito pelo estado de direito.
Joana Marques Vidal esclarece?
Depois de ter recusado pronunciar-se sobre a alegada violação dos direitos do empresário Carlos Santos Silva, amigo de José Sócrates, e do seu advogado durante as respectivas detenções, a Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, vem agora dizer que o Ministério Público “não deixará de recorrer a todos os procedimentos previstos na lei”, sempre que “da análise de elementos que venham ao seu conhecimento resultar qualquer indício de ilegalidade ou irregularidade”. Se pretende ou não fazê-lo é coisa que não revela.
Num artigo de opinião que Paula Lourenço escreveu para o boletim da Ordem dos Advogados, a representante legal de Carlos Santos Silva e do advogado Gonçalo Trindade Ferreira, indiciados por fraude fiscal, branqueamento de capitais e corrupção, no âmbito da Operação Marquês, fala em ausência de mandados e ilegalidade na recolha de provas para concluir que os seus clientes foram alvo de sequestro.
Todo o artigo é, porém, escrito na base da suposição: "Suponhamos que os autos de busca, nomeadamente ao escritório do advogado, são falsos. Que, em vez de atestarem com verdade onde e quando foram apreendidos os documentos, telefones, dinheiro e computadores referem falsamente que foram apreendidos apenas e só onde as buscas estavam autorizadas." É neste cenário hipotético que descreve como agentes da autoridade “agarraram” literalmente no advogado e o levaram para sua própria casa, onde terão levado a cabo uma “busca não autorizada” na presença da mulher, do filho de cinco anos e de um bebé de dois meses, que terão assistido “horrorizados” à “violência com que despejaram gavetas e circularam em passo militar pela casa”.
O que Joana Marques Vidal vem agora esclarecer é que a advogada do amigo de José Sócrates utilizou, junto do Tribunal da Relação de Lisboa, o mesmo tipo de argumentos para contestar a prisão preventiva de Carlos Santos Silva. Como ainda não houve uma decisão judicial sobre a matéria, o Ministério Público “não pode nem deve efectuar qualquer comentário” sobre a matéria.
“Neste, como em todos os casos semelhantes, o Ministério Público tomou posição no local próprio, isto é, no âmbito do processo, não podendo, nem devendo, efectuar qualquer comentário sobre matéria a aguardar decisão judicial em sede do recurso interposto”, refere um comunicado do gabinete de Joana Marques Vidal que chegou ao final da tarde às redacções. No fim-de-semana, a Procuradora-Geral da República tinha-se limitado a invocar o segredo de justiça para justificar o seu silêncio sobre as acusações da advogada – que o PÚBLICO tem tentado contactar, mas sem sucesso.
17 fevereiro, 2015
Paula Lourenço - Advogada
Texto da advogada Paula Lourenço na Revista da Ordem dos Advogados. Agora digam-me que está tudo bem,
JE NE SUIS PAS CHARLIE. JE SUIS AVOCAT!
Vamos a um supor :
O direito de defesa é sagrado num país que se diz um Estado de Direito.
O segredo de justiça é excepcional, pois como regra, o processo penal é público. Existirá se o MP entender que os interesses da investigação o justificam, e o Juiz de instrução validar esse entendimento.
Estão vinculados ao segredo de justiça todos os sujeitos e participantes processuais, bem como as pessoas que, a qualquer titulo, tenham tomado contacto com o processo ou tido conhecimento dos seus elementos.
Nesta medida, num processo sujeito a segredo de justiça, os investigadores sabem de todas as diligências que foram feitas, de todos os documentos reunidos, de todos os depoimentos ou interrogatórios realizados e de todas as escutas efectuadas. Já os arguidos e seus advogados têm apenas acesso aqueles elementos que a investigação e o Juiz de instrução lhes facultarem, nomeadamente no 1º interrogatório e para efeito de aplicação de medidas de coacção.
Esta é a tensão que importa registar: se, por um lado, o arguido tem o direito de se defender - direito garantido constitucionalmente - por outro, terá de o fazer nos termos definidos no CPP e atentas as circunstâncias algo limitadoras do segredo de justiça a que está sujeito, pois é óbvio que o direito de defesa não é completo sem se saber o que consta do processo.
Registadas as balizas do equilíbrio legislativo que se pretende entre o direito de defesa do arguido e a necessidade do segredo de justiça na fase de investigação, façamos um exercício do "vamos a um supor".
− Suponhamos que existia um processo em segredo de justiça iniciado em Julho de 2013 de que falavam os jornais, em particular a partir do verão de 2014;
− Suponhamos que para essa investigação e na sequência, concerteza, de promoção do MP, emitiu o Juiz de instrução 3 mandados de detenção fora de flagrante delito para serem usados pelos OPC nos dias seguintes à sua emissão;
− Suponhamos mais um pouco: que os OPC, em vez de fazerem uso dos mandados que deveriam entregar aos visados, no momento em que os privaram da sua liberdade não o fizeram, pois nessa altura teriam também de os constituir arguidos, ficando então evidente o direito a assistência de um defensor em todos os actos do processo e comunicado aos mesmos o direito a fazer a regulamentar chamada para um advogado;
− Suponhamos agora que os cidadãos chegam ao aeroporto num voo proveniente de Paris pelas 18h, que são presos sem mais, sem que lhe seja entregue um mandado de detenção, que lhe são retirados os telemóveis das mãos para que não possam fazer qualquer contacto, que são levados sob forte escolta (com mais de 15 elementos) para a Alfândega de Lisboa, onde são revistados, e apreendidos todos os documentos que transportavam consigo, sem que igualmente houvesse um mandado para o efeito. Que de seguida são conduzidos às viaturas que tinham no parque do aeroporto, as quais são revistadas, e apreendidos todos os documentos, telemóveis, e computadores que aí se encontravam, sem que houvesse qualquer mandado;
− Suponhamos que posteriormente, sempre sob forte escolta policial, são os arguidos levados para o local do seu trabalho onde já decorriam buscas com cerca de 30 OPC;
− Suponhamos ainda que, nesse local onde chegaram os arguidos se encontrava já o "Juiz das Liberdades e Garantias" e o MP, representando ele mesmo a legalidade e a sua execução;
− Suponhamos agora, que por não ter sido entregue o mandado de detenção nem feita a constituição de arguido, nem garantida a presença do advogado, as buscas que continuaram na casa de um dos putativos detidos são complementadas com um "interrogatório" de várias horas ao seu cônjuge;
− Suponhamos ainda que uma das vítimas do sequestro ocorrido no dia 20 de Novembro de 2014 (no âmbito deste exercício do "vamos a um supor") era advogado, e que a busca autorizada era igualmente para o seu gabinete de advogado;
− Suponhamos que o mesmo, em vez de assistir à busca que decorria no seu gabinete foi mantido preso na sala de reuniões das instalações buscadas;
− Suponhamos agora que, movidos pelo poder desmedido e adrenalina circulante (galvanizada pelo número de OPC intervenientes - mais de 30 - pela presença de um Juiz de instrução e de um alto Procurador da República), pelos 22h30 "agarram", literalmente, no advogado, o levam para a sua própria casa e aí fazem busca não autorizada, apreendem documentação vária na presença da mulher, do filho de 5 anos e do bebé com 2 meses, que assistem horrorizados à violência com que despejam gavetas e circulam em passo militar pela casa;
− Suponhamos agora que os autos de busca, nomeadamente ao escritório do advogado, mas não só, são falsos. Que em vez de os mesmos atestarem com verdade onde e quando foram apreendidos os documentos, telefones, dinheiro e computadores, referem falsamente que foram apreendidos, apenas e só, no sítio onde as buscas estavam autorizadas;
- Suponhamos ainda, malevolamente, porque tal situação, claro, não seria possível num país como Portugal, os arguidos - presos, interrogados sem apoio de um advogado, sujeitos a revista ilegal, a buscas ilegais nas suas casas e nos seus carros - são afinal notificados dos mandados de detenção e constituídos arguidos pelas 3h da manhã, quando tudo termina, buscas incluídas;
- Suponhamos que os arguidos só têm acesso ao advogado no dia seguinte, pelas 11h da manhã, sendo de seguida encaminhados para os calabouços do TCIC, e que só voltam a ter acesso ao advogado (apesar deste também se encontrar no mesmo edifício, mas num piso menos subterrâneo...) pelas 18h do dia 21 de Novembro de 2014, altura em que lhes é fornecida a imputação de factos nos termos do art.143º do CPP;
− Suponhamos que, para discutir a mesma, foi dada ao advogado 1h30, a distribuir pelos dois clientes que patrocinava;
− Suponhamos agora coisas descabidas: suponhamos que os arguidos, durante os 5 dias que duraram as diligências de 1º interrogatório para aplicação de medidas de coacção, não tiveram sequer direito a tomar banho, a mudar de roupa, a apresentar-se condignamente perante o Juiz que os vai interrogar;
− Suponhamos que é o advogado quem, diariamente, e torpedeando a ordem expressa dada à PSP e ao estabelecimento prisional junto da PJ, leva aos seus clientes roupa interior e camisas lavadas que os arguidos trocam à pressa e quando autorizados pelos elementos policiais na casa de banho do TCIC;
− Suponhamos ainda que, no próprio dia em que é entregue aos arguidos a imputação de factos, urna súmula perfeita da mesma aparece no "Sol on-line";
− Suponhamos mais: que interessava a uma particular investigação instrumentalizar a comunicação social, usando como guardas avançados o jornal Sol e o Correio da Manhã no sentido de conferir um mandato directo do povo aos juízes, garantindo uma "legitimidade" de actuação e uma garantia de bastarem as suspeições onde falham os factos:
− Suponhamos então que, dia após dia, os arguidos assistem, estarrecidos, à mais pérfida violação do segredo de justiça. E que tomam conhecimento através dos jornais de novos factos, com os quais não foram confrontados nos seus interrogatórios, castrando-se assim o seu direito a defesa;
− Suponhamos ainda que um dos arguidos acabou por ficar em prisão preventiva sob pretexto de existir perigo de fuga, porquanto aquele era detentor de meios financeiros que lhe permitiriam refazer a vida em qualquer parte do mundo, e perigo de perturbação do inquérito, porquanto ainda decorriam as diligências de cooperação com instituições bancárias na Suíça, podendo a liberdade plena fazer perigar as mesmas:
− Suponhamos no entanto que logo a seguir o próprio Juiz de instrução faz cessar o primeiro fundamento "congelando" todas as contas do arguido, e que as ditas relações com a Banca Suíça já existem desde 1 de Novembro de 2013, não havendo possibilidade do arguido as fazer "perigar";
− Suponhamos finalmente que, agora por decisão e práctica da investigação, os principais factos e suposições do processo se discutem na praça pública, dia após dia, jornal após jornal, apenas com a versão da Acusação;
− Suponhamos que o arguido, que não descansou e não descansa de fazer a sua defesa, sabe agora que foram utilizados meios de prova proibidos e dadas informações falsas no âmbito de cartas rogatórias. E ainda que, logo no início do processo, foram apresentadas as mesmas conclusões que viriam a ser repetidas, nos seus precisos termos, para efeito de aplicação das medidas de coacção aos arguidos, 1 ano e 2 meses mais tarde.
− Neste exercício quase terminado do "vamos a um supor", caso estivéssemos no terreno e não num jogo intelectual, como se deveria comportar o advogado que garante a defesa destes hipotéticos arguidos?
− Se a investigação - ela mesma - humilhou, ridicularizou e espezinhou o sigilo de que diz necessitar para prosseguir o seu trabalho, deve ainda assim o advogado ficar refém de uma qualquer ressonância criminal do segredo de justiça? Pode-se ainda argumentar que este segredo de justiça aniquilado é necessário à eficácia da investigação?
Como se compagina neste jogo do "vamos a um supor", o direito de defesa?
A lealdade processual impõe que, mesmo estando o processo em segredo de justiça, os factos relevantes sejam primária e directamente comunicados aos arguidos. É absolutamente inadmissível, por desleal e criminoso, que factos em segredo de justiça venham a público através da comunicação social ainda antes de os arguidos serem com eles confrontados. É frequente ler-se e ouvir-se na comunicação social a revelação de factos atinentes ao processo em segredo de justiça sem que o arguido tenha deles conhecimento, precisamente por estarem em segredo. E o mais grave é que também com demasiada frequência os meios de comunicação indicam como fontes da notícia "fontes próximas do processo". A experiência mostra que efectivamente muitos jornalistas têm acesso privilegiado a informações sobre factos do processo em segredo de justiça, donde que comece a ser necessário que os advogados penalistas tenham também eles um jornalista de serviço e naturalmente de preferência que tenha acesso fácil "a fontes próximas dos processos"! Chega a parecer que a violação do segredo de justiça mediante a divulgação de indícios ou meras presunções através dos meios de comunicação social é um meio de que se servem as autoridades para criarem um clima populista de condenação dos suspeitos na praça pública para justificar medidas menos ponderadas ou ilegais ou injustas. Que pelo menos parece ser assim, parece, e por isso a inevitável suspeita face à frequência do fenómeno.
Estes procedimentos implicam novas estratégias de defesa. O arguido já não tem só de defender-se no processo judiciário, mas também no processo mediático. Naquele, por imposição da lei, deve usar uma estratégia de conivência; no mediático, uma estratégia de ruptura. Perante as acusações indirectas feitas pelos media o arguido tem direito a defender-se por todos os meios ao seu alcance, mesmo com violação do segredo de justiça se for necessário à sua defesa, porque a defesa é direito sagrado.
Há muitos segredos que raramente são violados. Também se podem apontar exemplos de processos criminais em que o segredo de justiça foi respeitado, não obstante a apetência pela notícia. Estou convencida que a violação do segredo de justiça através dos meios de comunicação só acontece porque convém às autoridades arregimentar apoios populares, ou então porque a quem o faz lhes falta educação democrática.
É tempo de nos insurgirmos todos contra o estado a que a justiça chegou.
Não sou "Charlie". Sou advogada e também luto por uma justiça e sociedade melhores.
Justiça ?
Apesar disso, a Procuradora-Geral da República (PGR), Joana Marques Vidal, recusou comentar o artigo de Paula Lourenço. A PGR diz apenas que "o Ministério Público pronuncia-se no âmbito dos processos" e que, por agora, não há "informação adicional à anteriormente prestada". "O processo mantém-se em segredo de justiça", diz a Procuradora-Geral.
Ora, conforme se lê no Código do Processso Penal (art.º 86, n.º 13.), "O segredo de justiça não impede a prestação de esclarecimentos públicos pela autoridade judiciária, quando forem necessários ao restabelecimento da verdade e não prejudicarem a investigação: a) A pedido de pessoas publicamente postas em causa; ou b) Para garantir a segurança de pessoas e bens ou a tranquilidade pública."
Perante factos tão deploráveis como os que foram denunciados pela advogada de dois arguidos, a Procuradora-Geral da República não pode refugiar-se no habitual chavão "não comento, o processo está em segredo de justiça", prolongando as dúvidas dos cidadãos face ao que foi relatado. Também o silêncio da Ordem dos Advogados se torna incompreensível perante a denúncia feita no seu órgão oficial.
A indiferença da PGR perante a intranquilidade dos cidadãos só pode causar estranheza.
Justiça?
As acusações da advogada dirigidas aos responsáveis do processo em que foi detido José Sócrates assumem indiscutível relevância social por, a confirmarem-se, constituírem violação de direitos de Santos Silva e de Gonçalo Trindade Ferreira. Embora escrito em formato de artigo de opinião e sem os nomes destes dois arguidos, os dados invocados situam claramente no espaço e no tempo os acontecimentos que rodearam a detenção de ambos.
O artigo causou alarme social, como confirmam as reacções não apenas nos media audio-visuais e impressos mas também nas redes sociais, onde a perplexidade e insegurança quanto aos procedimentos usados pelas autoridades judiciais se manifestaram com veemência. In "Vai e vVm"
12 fevereiro, 2015
11 fevereiro, 2015
Durão Barroso com reforma vitalícia aos 58 anos - Não resisto a repassar este email:
VEJAM SÓ O QUE ESTE "pobre" E OBEDIENTE MOÇO DE RECADOS DOS GRANDES INTERESSES MUNDIAIS, VAI RECEBER COMO PENSÃO E COMPENSAÇÃO, DEPOIS DE LONGOS 12 ANOS DE "ESFORÇADO TRABALHO" NA UNIÃO EUROPEIA..
Durão Barroso vai dar aulas na Universidade Católica e já tem uma reforma vitalícia de 11 mil euros mensais por 10 anos de 'trabalho'
Durão Barroso vai receber 132 mil euros por ano de reforma, até ao fim da sua vida, ou seja, 11 mil euros por mês, avança o "Daily Mail"
Mas não só. O presidente cessante da Comissão Europeia vai também receber um subsídio de reintegração e transição durante 3 anos, que pode chegar aos 200 mil euros por ano (passa de 5 mil euros por mês).
Além disso, vai ganhar um salário extra de 25 mil euros mensais, mais despesas de deslocação.
Ao todo, vai receber mais de 41 mil euros por mês.
Esta remuneração já foi alvo de críticas por parte dos britânicos.
Os deputados conservadores britânicos foram os primeiros a manifestarem-se, referindo-se à "ganância e arrogância dos gatos gordos da UE".
O conservador britânico Stewart Jackson afirmou: "Isto não me surpreende. Os britânicos estão fartos da arrogância e ganância dos 'gatos gordos' da União Europeia, que nunca foram eleitos, como o Barroso. Está na hora do Reino Unido mostrar os músculos e de David Cameron assumir a liderança e colocá-los no lugar".
Ao fim de dez anos, Durão Barroso, agora com 58 anos, deixou a presidência da Comissão Europeia no passado dia 1 de Novembro de 2014 e vai começar a dar aulas na Universidade Católica no próximo dia 26 de Fevereiro de 2015.
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09 fevereiro, 2015
Muito BOM
Na fila do supermercado, o caixa diz a uma senhora idosa:
- A senhora deveria trazer as suas próprias sacolas para as compras, uma vez que sacos de plástico não são amigos do ambiente.
A senhora pediu desculpas e disse: - Não havia essa onda verde no meu tempo.
O empregado respondeu: - Esse é exatamente o nosso problema hoje, minha senhora.
A sua geração não se preocupou o suficiente com o nosso ambiente.
- Você está certo - responde a velha senhora - a nossa geração não se preocupou adequadamente com o ambiente. Naquela época, as garrafas de leite, garrafas de refrigerante e cerveja eram devolvidos à loja.
A loja mandava de volta para a fábrica, onde eram lavadas e esterilizadas antes de cada reuso, e eles, os fabricantes de bebidas, usavam as garrafas, umas tantas outras vezes.
Realmente não nos preocupamos com o ambiente no nosso tempo. Subíamos as escadas, porque não havia escadas rolantes nas lojas e nos escritórios. Caminhávamos até ao comércio, ao invés de usar o nosso carro de 300 cavalos de potência de cada vez que precisamos ir a dois quarteirões.
Mas você está certo. Nós não nos preocupávamos com o ambiente. Até então, as fraldas dos bebés eram lavadas, porque não havia fraldas descartáveis. Roupas secas: a secagem era feita por nós mesmos, não nestas máquinas bamboleantes de 220 volts. A energia solar e eólica é que realmente secavam nossas roupas. Os meninos pequenos usavam as roupas que tinham sido dos seus irmãos mais velhos, e não roupas sempre novas.
Mas é verdade: não havia preocupação com o ambiente, naqueles dias. Naquela época só tínhamos somente uma TV ou rádio em casa, e não uma TV em cada quarto. E a TV tinha uma tela do tamanho de um lenço, não um telão do tamanho de um estádio; que depois será descartado como ?
Na cozinha, tínhamos que bater tudo com as mãos porque não havia máquinas elétricas, que fazem tudo por nós. Quando embalávamos algo um pouco frágil para o correio, usávamos jornal amassado para protegê-lo, não plástico bolha ou pellets de plástico que duram cinco séculos para começar a degradar.
Naqueles tempos não se usava um motor a gasolina apenas para cortar a relva, era utilizado um cortador de relva que exigia músculos. O exercício era extraordinário, e não precisava ir a uma academia e usar esteiras que também funcionam a eletricidade.
Mas você tem razão: não havia naquela época preocupação com o ambiente. Bebíamos diretamente da fonte, quando estávamos com sede, em vez de usar copos plásticos e garrafas pet que agora lotam os oceanos.
Canetas: recarregávamos com tinta tantas vezes ao invés de comprar outra. Abandonamos as navalhas, ao invés de jogar fora todos os aparelhos 'descartáveis' e poluentes só porque a lâmina ficou sem corte.
Na verdade, tivemos uma onda verde naquela época. Naqueles dias, as pessoas apanhavam o autocarro ou o elétrico e os meninos iam nas suas bicicletas ou a pé para a escola, ao invés de usar a mãe como um serviço de táxi 24 horas. Tínhamos só uma tomada em cada quarto, e não um quadro de tomadas em cada parede para alimentar uma dúzia de aparelhos.. E nós não precisávamos de um GPS para receber sinais de satélites a milhas de distância no espaço, só para encontrar a pizaria mais próxima.
Então, não é risível que a atual geração fale tanto em "meio ambiente", mas não quer abrir mão de nada e não pensa em viver um pouco como na minha época?
Agora que você já leu o desabafo, envie para os seus amigos que têm mais de 50 anos de idade , e para os merdas que têm tudo nas mãos e só sabem criticar os mais velhos.
06 fevereiro, 2015
Juizes sindicalistas?
Não acreditamos mesmo nesta “gente”
“Durante meses o trabalho e a honorabilidade de personalidades da justiça como os envolvidos no processo contra José Sócrates tem sido posto em causa por sucessivas violações do segredo de justiça. Essas violações podem manchar procuradores e juízes envolvidos pois sugerem que alguém anda a enviar informação para os jornais para conseguir algo que nada tem que ver com julgamentos.
Depois de ter visto o líder da associação sindical dos juízes, uma aberração soviética que existe na nossa democracia, tão ofendido com as palavras desse senhor muito perigoso e ameaçador que se dá pelo nome de Mário Soares, interrogo-me porque razão o mesmo senhor ainda não interpelou a senhora Procuradora-geral sobre as consequências das sucessivas violações do segredo de justiça na imagem dos seus associados envolvidos nos processos judiciais alvo de regabofes jornalísticos.”
02 fevereiro, 2015
Carlos Alexandre - Juiz? Sobre ele
«"O juiz, depois do procurador Rosário Teixeira ter pedido a prisão preventiva, afirmou que esta medida de coação, a pecar, não era por excesso." DN de 27/1.
Tente ignorar que esta frase respeita a um processo em que está envolvido José Sócrates. Faça uma tentativa para esquecer que ele foi o homem que arruinou Portugal ou o herói que lutou até ao fim contra a intervenção externa. Desta vez, ponha para trás a sua convicção de que ele foi o melhor político português desde D. Afonso Henriques. Ou o pior. Pode ser complicado, mas assuma que está como praticamente toda a gente: não sabe se ele é culpado ou inocente dos crimes pelos quais está indiciado.
Mais difícil ainda. Tente pensar que é juiz. Que tem de julgar sem preconceitos, de esquecer as suas simpatias e antipatias. Que as suas decisões mudam a vida de qualquer pessoa e que não pode fundar as suas tomadas de posição em "eu cá acho" ou porque "aquilo daquele processo do Centro Comercial" foi muito esquisito ou porque aquelas casas eram de mau gosto ou porque "quem cabritos vende e cabras não tem, dalgum lado lhe vem" ou porque sempre tinha suspeitado que ali havia coisa.
Olhe para si como alguém que tem de ser um garante do Estado de direito, que tem de cumprir escrupulosamente a lei, de ser um bastião dos direitos consagrados na Constituição da República Portuguesa, um ponto de equilíbrio entre quem acusa e quem defende. Que sabe que não pode pactuar com julgamentos na praça pública, que não os pode promover passando ou deixando passar para esgotos a céu aberto, mascarados de jornais, pedaços de informação que devem permanecer confidenciais. Que jamais utilizará esses lodaçais para obter na praça pública as condenações que a lei e os seus procedimentos não permitem. Que não pode permitir que escutas sejam tornadas públicas, nem as que interessam ao processo nem as que não têm pingo de interesse para o que quer que seja senão para achincalhamentos públicos. Mais, que tem de ter um extremo cuidado para que essas não aconteçam e o mais depressa possível sejam destruídas.
Não se esqueça, também, que tem de ter uma exata noção da importância de uma decisão que sujeita a prisão alguém que ainda não foi, de facto, julgado. Alguém que ainda não pode defender-se de uma forma absolutamente cabal. Já imaginou a responsabilidade de tirar aquilo que a civilização ocidental considera o mais precioso bem? É que não há, em qualquer sistema de justiça de uma democracia, maior pena que a privação da liberdade.
Há, no entanto, um juiz que considera que tem indícios tão graves, tão graves, que está tão convicto da culpabilidade de alguém, que não só acha que ele deve estar preso - cumprindo, claro está, os requisitos da lei, ou melhor, estando certo de que esses requisitos se aplicam - que até pensa que devia existir uma medida de coação mais contundente. Dado que no nosso sistema não há nenhuma mais grave, em que é que o juiz estará a pensar? Chicotadas, tipo sharia? Não deve ser isso - é que até para aplicar chicotadas os condenados têm de ser julgados antes.
Aliás, achando que a prisão preventiva, neste caso, peca por defeito, das duas uma: ou o juiz pensa que o ex-primeiro-ministro deva ser amarrado e amordaçado para que não possa fugir, destruir provas ou repetir os crimes pelos quais está indiciado, ou então olha para essa prisão como uma pena e acha--a até leve. Qual das duas possibilidades a pior.
Verdade seja dita, nada se ganha em tentar interpretar aquela frase. Ela fala por si. Basta que fiquemos com a certeza de que há um juiz que pensa que a prisão preventiva não é medida de coação suficiente. Convinha, no mínimo, saber se já o tinha dito para outros casos e qual seria a sua sugestão para algo mais grave que a privação de liberdade sem julgamento. É que se o juiz Carlos Alexandre só fez este tipo de comentário no caso Sócrates, parece evidente que tem um preconceito contra o arguido em causa e que, assim sendo, não está capaz de cumprir corretamente as suas funções neste processo. Mas se também os fez noutros processos tem um problema mais grave, digamos assim.
De tudo, o que mais impressiona é a forma como aquele comentário não causou um tumulto na comunidade. Um juiz que tem os mais importantes processos deste país, faz um comentário daquela gravidade e toda a gente encolhe os ombros. Ouvimos uma ministra da Justiça a dizer que fala para o telefone como se fosse um gravador, vemos peças processuais em segredo de justiça a aparecer nos jornais, escutas circulam como se nada fosse, sentenças são lavradas dizendo que se julga interpretando o sentir da comunidade e tudo é encarado com normalidade: a anormalidade tornou-se normal. Só isso pode explicar que nem um único político tivesse uma palavra sobre o assunto, que nem um editorial tivesse sido dedicado a este assunto, que nem um único representante da justiça se tivesse indignado.
Não, o que se passa no processo Sócrates está longe, muito longe de ser normal. Mas o mal é mesmo maior, muito maior.» [DN]
Autor:
Pedro Marques Lopes.