Do risco para a incerteza
por VIRIATO SOROMENHO-MARQUES
Os sucessivos anúncios de uma data para o regresso de Portugal aos mercados
ou para o retorno do pagamento dos subsídios de férias e de Natal aos
funcionários públicos não são apenas um sinal da contradição que, aparentemente,
reina no interior do Governo, são sobretudo um indicador da profunda ignorância
sobre a efetiva situação em que Portugal hoje se encontra, ou ainda, mais uma
modalidade de simples simulação, instrumento retórico, infelizmente, muito
abundante na vida política. O destino de Portugal está inteiramente vinculado ao
agravamento da crise europeia, impropriamente designada como "crise das dívidas
soberanas".
Na verdade, a Europa vive a agonizante contradição entre problemas
de dimensão sistémica, que encontrariam uma resposta árdua mas triunfante
através do método federal, e a exiguidade, tibieza e falta de adequação de
respostas talhadas numa visão nacional. Em vez de uma cooperação a caminho do
federalismo, a Europa tem respondido à crise com respostas competitivas e
egoístas que só têm agravado os problemas, que supostamente visariam responder.
O que está a acontecer é que a construção europeia está a passar da fase do
risco para a fase da incerteza. A diferença entre os dois conceitos é a base do
negócio das companhias de seguros. É possível segurar o risco do acidente de
viação, pois posso calculá-lo, mas ninguém segura riscos associados a alterações
climáticas, pois aí reina a incerteza. O tempo da Europa, e consequentemente de
Portugal, já passou a fase do cálculo, para entrar na entropia da incerteza. O
tempo não pertence a Vítor Gaspar, mas ao jogo de dados a que uns chamam deus, e
outros azar.
Ninguém sabe quando, e se, Portugal voltará aos mercados. ( dn )
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