Que moral
Pinto Balsemão
Contra o Estado nas palavras, de mão estendida nos actos
Não é comum um jornal abrir as suas páginas ao patrão de um grupo de comunicação social concorrente. Mas só os mais distraídos podem estranhar que o Público faça hoje uma entrevista de três páginas, com chamada na capa, a Balsemão, na qual o “militante n.º 1” do PSD se atira com unhas e dentes ao Governo, em especial a Santos Silva.
Está subjacente a toda a entrevista que Balsemão queria mais apoios do Estado à comunicação social, em especial às televisões privadas: “ao ter publicidade, [a RTP] está a ficar com uma fatia de um bolo que já é pequeno”. É por o Governo não querer que os contribuintes sustentem a SIC e a TVI que Balsemão o acusa de querer acabar com a comunicação social privada.
Recorde-se como decorreu esta legislatura:
• Foi a primeira vez na história da democracia em que uma mudança política não implicou uma mudança na administração da RTP;
• Foi criada por maioria qualificada a ERC, dando cumprimento à revisão constitucional aprovada com os votos do PSD, CDS e PS em 2004;
• Foi publicada a lei da reestruturação da RTP, que consagra a total independência da direcção de informação ao nível da responsabilidade editorial;
• Foi publicada a Lei da Televisão, privilegiando os direitos dos telespectadores, por exemplo, quanto às práticas de contraprogramação;
• Foi alterado o Estatuto do Jornalista, no sentido de reforçar os direitos dos jornalistas quanto ao sigilo profissional e aos direitos de autor;
• Foi proposta a lei do pluralismo e da não-concentração dos media, que continha justamente uma norma que garantia, de forma inequívoca, a independência editorial das direcções de todos os órgãos de comunicação social face às respectivas administrações (que contou com os votos contra de todos os partidos da oposição e foi vetada pelo Presidente da República).
Percebe-se que Balsemão esteja desiludido: o governo não apenas não permitiu o abocanhar desregulado do bolo da publicidade, como ainda impôs regras apertadas em defesa dos direitos dos telespectadores (limitando a contraprogramação) e dos jornalistas (restringindo o uso discricionário dos seus trabalhos pelos patrões dos media), medidas que não deixam de ter impacto financeiro.
[in Simplex]