08 setembro, 2009

Daniel Proença de Carvalho, escreve assim:

«Voltou em força ao debate eleitoral a questão da liberdade de expressão em especial no campo da Comunicação Social.

Claro que a liberdade de expressão é um valor inerente à Democracia, está inscrito na nossa Constituição como um dos direitos fundamentais e cabe à entidade independente ERC zelar pelo seu escrupuloso respeito. Compreendo que as oposições estejam atentas à preservação desse valor. Convém no entanto não esquecer que a liberdade de expressão tem como limite outros direitos fundamentais de todos os cidadãos, de igual dignidade constitucional: o direito "à integridade moral", o direito "ao bom nome e reputação", o direito "à reserva da intimidade da vida privada e familiar", o direito à presunção de inocência. Se quisermos com objectividade avaliar o grau de respeito pelos dois valores constitucionais em causa, a conclusão parece óbvia: em Portugal, os meios de Comunicação Social pura e simplesmente ignoram e desrespeitam diariamente os direitos de personalidade. Sob o pretexto da liberdade de expressão e de crítica, são espezinhados os direitos ao bom nome e à reputação; e quanto à presunção de inocência, foi substituída pela presunção de culpa, quando se trata de cidadãos com notoriedade e em particular dos políticos. Sou dos que pensam que não há verdadeira e saudável democracia sem o respeito tanto pela liberdade de expressão como pelos direitos que sustentam a dignidade das pessoas.

Este desequilíbrio vem envenenando o espaço público. A discussão dos nossos problemas políticos, económicos ou sociais, deu lugar a campanhas de pura difamação e calúnia, perante a indiferença geral. Os políticos babam-se de gozo quando os adversários são causticados com suspeições sem objectividade, insinuações pérfidas ou acusações sem fundamento. Assim se vai degradando o espaço político. Vai longe o tempo em que os fundadores da nossa Democracia e que se bateram pela sua institucionalização - Mário Soares, Sá Carneiro, Freitas do Amaral, Mota Pinto - compreenderam a absoluta necessidade de preservar esses valores ligados à dignidade das pessoas.

Quando Sá Carneiro foi cobardemente vilipendiado pelo jornal "Diário", do Partido Comunista, não me recordo de o Partido Socialista ou o CDS terem alinhado, por acção ou omissão, nessa campanha, nem vi alguém acusá-lo de por em causa a liberdade de imprensa quando perseguiu criminalmente nos tribunais os responsáveis pela calúnia. Quando Leonor Beleza foi vilmente perseguida com acusações absurdas, vi levantar-se a voz do socialista Mário Soares e do democrata cristão Freitas do Amaral contra essa perseguição. Quando Roberto Carneiro (que foi ministro pelo CDS) foi acusado pelo MP, sem ponta de fundamento, não só nenhum político do PS ou do PSD se aproveitou dessa injustiça, como os seus líderes se solidarizaram com a vítima do justicialismo que o acusou.

No actual momento, decretou-se um requiem pelos valores da pessoa no altar da liberdade de expressão. Perante a indiferença geral, cometem-se todos os dias crimes de violação do segredo de justiça para imolar cidadãos indefesos. Os responsáveis pela justiça não cumprem o seu dever de sancionar esses comportamentos ilícitos, sendo mesmo suspeitos de os praticarem. Cobardia de uns, aproveitamento de outros, pagaremos caro essa deriva.» [Diário Económico]

 

 

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